segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

Confeitando

Confeitando seu milésimo bolo naquele dia fatídico imaginou não estar ali,num dia nublado onde tudo parecia nada acontecer e ele lá para lá da estrada vermelha de seus sonhos sem fim.Seria o último bolo daquela tarde e terminado este trabalho pôs-se a caminhar em direção...certeza lhe faltava.Pra onde iria?Ninguém a lhe esperar em casa!Ninguém pra visitar naquela cidade estranha.
Desobedeceu as regras da educação e bateu numa casa que sempre passara em frente e que de leve acenava a cabeça em cumprimento ao dono da mesma,tocou a campainha e de súbito uma senhora de cabelos brancos atendeu-lhe:"Boa tarde",disse ela.
Não havia pensado em uma conversa.Como iniciaria um prólogo com esta senhora que até então nunca tinha visto ali?
-Boa tarde,eu sempre passo por aqui e hoje resolvi conversar um pouco.
Percebeu a besteira que falara mas como correr atrás das palavras já soltas ao ar?
A senhora sorriu e disse:
-Eu já sabia
-Sabia?
-Você faz o estilo do homem que se arrepende tarde!
-A senhora é feiticeira?
-Poderia me ofender com esta pergunta.
-Me desculpe,ruborizou.
Gargalhou a senhora,e disse:Entre,na porta a conversa se desvia.
Entrou ainda vermelho por ter chamado a senhora de bruxa.Seria pela idade?Beleza ela tinha,beleza de uma senhora que havia vivido de forma agradável dos quais arrependimentos não havia,e se estes existem já foram sanados pela sabedoria própria.
-Não imagine que todos velhos são sábios.
Ela interrompeu seus pensamentos com essa adivinhação.
-Mas...como?
-Como sei que você estava a pensar isso?Ora meu rapaz você é tão claro como àgua servido em taça de cristal.Na vida precisa-se aprender a driblar a inocência.
-Tenho me sentido inferior a mim mesmo.Confessou ele
-Como?Explique-se
-Não sou metade daquilo que já fui e caminho pouco em direção ao que quero ser hoje.
-Sente-se perdido em amores ou ciladas? a velha continuou taxativa.
-Procuro desvendar as ciladas e descubro que podem ser amores.
-Amores podem ser encontros de uma noite e nada mais.Investigue a necessidade que tens de aproximar-se pedindo acolhimento.Algo teu ou imposto?
-Compreendi pouco.
-Impuseram-lhe a necessidade de pedir perdão pelo que és?Ou lhe é natural desculpar-se?
-Não saberia dizer.
-E agora sabes?
-Não,ainda não.
-A senhora viveu romances?
Como sonhadora a velha respondeu:Vivi um amor!
-É este senhor com quem encontro na ida e na volta do trabalho sempre?
-Não,não.Este é meu irmão.Ficou viúvo cerca de três anos e suporta pouco viver só.Veio morar aqui.
-A senhora também é viúva?
-Quase.
-Quase?
-Matei-o em meu coração.
-Traição?
-Sim.
Ele esperou um pouco mais;a velha percebeu e assim queria.Continuou.
-Traiu-me quebrando nossos princípios tínhamos um pacto,consistia em nunca deixar de nos fazermos felizes,na dor e principalmente na bonança que é a fase mais fácil de esquecermos o ser amado.Em uma noite qualquer ele chegou cabisbaixo e assim fez por três meses.Nenhuma conversa animava-o até que um dia me contou estar com câncer.
-A senhora divorciou-se num momento tão difícl como esse?
-Não;não o deixei.Ele nos deixou.
-Compreendi pouco.
-Não há traição maior do que fazer exclusiva a dor que deve ser compartilhada.
-Compreendi.
-Pouco?Ousou a senhora a fazer uma piada.
-Ao contrário compreendi tudo,ou pelo menos uma boa parte.
Riram juntos.
-Descuple-me posso te oferecer um chá?
-Não,obrigado já estou de saída.
-Obrigada pela visita.
-Estou convidado a voltar?
-Só em dias nublados.Gargalharam!!

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

Encontro

Fechada a porta do carro Fernando entra em casa calado,pega o telefone e disca pra pizzaria:"Uma de milho,por favor.Travessa Miller Jardim,95,Centro".Com as costas pesadas de carregar um peso extraordinariamente maior que si tentou relaxar no sofá,o nada ambivalente lhe causou náuseas,levantou foi até a janela abriu as cortinas e absorto ficou.Em um instante qualquer lembrou que daquela favela em frente a sua janela balas perdidas poderiam ser recorrentes,afastou-se.Até então ninguém conhecido morrera em um acidente como este mas havia pânico provocado por várias falas tv,vizinhos,jornal,internet."Ama-se a violência mesmo quando ela é quase inexistente",pensou.
A pizza chegou e como sempre pagou desgostoso e não deu gorjeta alguma.Uma,duas fatias e nada mais,as sobras iam ao lixo e amanhã outra pizza talvez de champignon.
Fazia um tempo que não se relacionava com alguém,alguém era um termo abrangente apropriado a sua bissexualidade,passou o tempo de predador indomável quando saía para bares,bailes,jogos de futebol que odiava por simples desejo de trepar;começou a repensar sua conduta.
Depois de transar com todas as melhores amigas,com o síndico,o porteiro,o faxineiro,os vizinhos do apartamento de cima,de baixo e outros dois ao lado, repensou.Colocou-se numa sala interior em busca de sentido,pouco importa
o tamanho deste o caminho percorrido é intermitente,fez uma religião.
Uma religião sem nome,sem normas, sem ele.
Pensa-se.Tão somente isso.
Três horas e meia depois tomou um banho,bebeu açaí e saiu.
Uma volta de carro pra espairecer e poluir um pouco mais o planeta,encontrou um velho conhecido de colégio Renato seu nome,por coincidência encontraram-se próximos ao colégio que estudaram.Renato havia pensado a mesma coisa que ele toda vez que se sentia triste oco por dentro ele passava em frente ao colégio pra lembrar que um dia foi feliz,obra do destino neste dia decidiu descer do carro e ir até o portão sentir o frio das grades de ferro fazendo por um segundo retornar a infância.
Encontraram-se ali.
Amaram-se no apartamento de frente pra favela com a possibilidade de balas perdidas.
Fernando saiu de si e entrou em outro.

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

Árvore

Pendurou uma corda na árvore antiga,plantara tão frondosa espécie sendo garoto 10 anos de idade contava, neste tenro período sonhava em ser biólogo após breve explicação do pai sobre o que viria a ser tão profunda ciência,herança familiar os avós maternos haviam exercido esse ofício decidiu a partir daquele dia cuidar do mundo verde.
Naquele quintal plantara de tudo goiabeira,amoreira,hortaliças,flores na varanda de casa era de dar inveja a qualquer floriculturista, viveu entre plantas e família,chegara o período de namoro Rosa sua primeira garota recebeu buquês infindos até o dia que exigiu uma aliança de compromisso recebido dentro de uma violeta.A primeira transa do casal foi inesperada e encostados na bendita àrvore que ele passara a amar desde então;toda ruptura do casal era desfeita com o envio de uma Tulipa e foram tantas Tulipas que a preocupação foi grande caso acabassem as mudas desta conciliadora eficaz.
Casaram-se ao ar livre num campo repleto de beleza natural.Verdade dita este bicho grilo não se tornou biólogo e sim fazendeiro negativamente deixaria sua vida,sua roça pra fazer faculdade longe e depois de casado o que lhe interessava era Rosa e seus possíveis filhos.Estes não vieram.
Por dez anos esperaram,rezaram,fizeram promessas,trocaram de religião,voltaram pro catolicismo mas os rebentos por força do destino os deixaram a esperar por uma vida toda;eles se bastavam.Afilhados tinham aos montes Rosa tinha 6 irmãos ao todo dezesseis sobrinhos,todos queridos e cientes do amor incondicional de tios quase velhos.
Enterrou os pais no cemitério próximo coroas floridas deixava pra cada um toda semana.
Rosa sentiu-se mal no final de uma tarde quando observava o pôr do Sol costume da moça interiorana,um aperto no peito dizia ela,deitou-se e dormiu.Ele despertou ao fecharem o caixão de Rosa e rezarem Ave Maria,chorou.
Ao olhar pro quintal após uma semana sem Rosa,agradeceu aos céus pela vida que teve com bela mulher,pelos afilhados recebidos de presente,pelos pais tão fortes e corajosos nenhuma lágrima escorreu.
Foi ao quarto de depósitos de ferramentas pegou uma corda amarrou firmemente na árvore amiga de tanto tempo,laçou o pescoço num final de tarde de setembro.

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

Celso

Foi num turbilhão de problemas que ele pensou em recomeçar,havia tantas coisas a serem feitas só faltava o primeiro passo,a direção lhe faltava.Tomara proporções gigantescas aquele último jantar.Dias antes reservara dois lugares em um luxuoso restaurante(nem tão luxuoso assim mas para o seu bolso semi vazio de jornalista era uma fortuna)fez free pra algumas revistas internacionais que gostam de explorar a imagem do país no exterior como canibais que andam em Mercedes Benz coisa que jurara desde a formatura nunca se dispor a fazer.
Mulheres;elas mudam os cursos da vida de um homem,de qualquer homem.
Já no restaurante a espera foi de mais ou menos uma hora,quando à viu entrar pelas portas com seu vestido vermelho tomara que caia pensou:"Não caia vestido,não aqui"a idéia de outros homens ver aquele tesouro que ele por meses garimparar lhe causava fúria mortal,sorriu.
Ela afoita em sua maquiagem de Ava Gardner pediu desculpas pela demora num tom grave de Marlene Dietrich e calou-se.Entrou num absurdo silêncio e olhar hipnótico pro relógio de um antiquário qualquer do século 15.A noite começara de forma abrupta pensou que fosse charme.
Tentara outra vez uma conversa trivial:"Soube que a editora da tua revista tem visto teus artigos como os mais excelentes de todos os tempos daquela redação"
-Ela é uma simples redatora gentil,respondeu a moça asperamente
-Já faz algum tempo que ela não elogia alguém dessa forma com toda certeza tua perspicácia foi aguçada pelo teu ótimo desempenho.Tentou ele pela terceira vez.
-Eu não faço por mal e nem por bem,faço o que faço pelo sentido de fazer.A resposta da minha vida esta na consequência dos exercícios,sejam intelectuais,físicos e amorosos.Este último item foi enfatizado num tom leve e firme seguido de uma outra frase feliz.
-Pague a conta!
Sem acenar a possibilidade de contrariar a mulher que até então desconhecia,pagou o jantar e levantaram-se juntos foram em direção ao carro dele e uma mão compenetrada entrou por sua braguilha.Ali em meio a carros e motel a jornalista exercitou seu dom peculiar.Após rápido prazer ela chamou um táxi e foi-se.
Na tentativa de reencontra-la caixa postal no celular,e negativas no trabalho.
Plantou-se no prédio da pequena editora até ver a jornalista de bom texto ao meio da tarde quando ela saiu apressada do prédio ele correu e diss-lhe:"Ainda bem que te encontrei" meio se ar continuou:"Tenho tanta coisa a ti falar mas andas sem tempo não é verdade?"
-Não,não é verdade.
Pausa.
-Não,não é verdade.
Pausa
-Você queria saber e te respondi pra quê esse olhar de espanto?
-És decidida demais não acha?
-Não,não é verdade,apenas gosto que me abordem com flores nas mãos e me convidem pro motel mais próximo e limpo.
Com um nó na garganta ele tentou novamente.

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

A flor

Brotando do peito uma flor amarela percebeu logo que desabotoou a camisa na chegada do trabalho as 17:40 de uma tarde de quinta-feira.Em uma quinta feira percebeu o brotar de uma flor amarela.Correu ao espelho e ficou estático vendo no peito a mudança ocorrida,sentiu medo angustia enfim;como contaria a esposa,aos amigos e o filho de quatro anos e meio entenderia?
As crianças sorriem sempre com a natureza talvez o filho fosse o único a entender completamente,mas e os vizinhos?Nunca mais tiraria a camisa pra lavar o carro nos finais de semana ensolarado ou na praia com os amigos,e a chuveirada no final do futebol já tinha por esquecida.
Com o filho na casa da sogra e a mulher pra chegar apenas as 21:00 pôs-se a pensar em como seria sua vida pós flor no peito,teria de tomar mais banhos ao dia?Expor ao sol?
Pensou em tornar-se floriculturista assim poderia tirar suas dúvidas sem problema aparente e foi assim que estava no devaneio quando ouviu o tilintar das chaves que vinham da sala de estar.Mônica chegará tão apressadamente e gritara:Surpresa.
Esposa e filho chegaram num roupante;com naturalidade pôs se sentaod na cama do casal a espera da chegada dos amantes queridos.A esposa pasmada com a cena de seu marido com uma flor amarelada nascida no peito sussurrou:Meu Deus!
Na volúpia infantil o filho correu ao pai e beijou a flor.Vinícius tudo entendeu.

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

Paulo,um quase João

Abriu a geladeira procurando algo que nem sabia ao certo o que viria a ser.Ouviu o velho cachorro resmungar um grunhido qualquer jogou um pedaço do frango recortado e cozido pro gordo Weimaraner cujo nome era Pico Terceiro lera um livro dos muitos de história do Brasil e colocou em seu cachorro este nome já que Dom Pedro pode ser Primeiro e Segundo por que seu cachorro não viria a ser Pico Terceiro mesmo não tendo existido algum primeiro quanto mais um improvável segundo.
Paulo seu nome 39 anos solteiro sem filhos morou três anos com uma moça na sua juventude e prometeu pra si não cometer esse sacrilégio contra a alma tanto dele quanto dela.Restringiu o amor ao tópico bobo da paixão,sempre que se sentia apaixonado ele dava asas ao sentimento e refreiava qualquer tipo de intromissão de fora.Amigos,família,religião nada pudera impedir suas paixões cria ele ter o poder de dar uma brecada na paixão no instante que quisesse assim viveu...
Chefe administrativo de uma empresa nacional de renome na América Latina sentia-se confortável com a profissão mantinha uma boa relação familiar filho único e atencioso aos pais que não o entendiam totalmente mas o aceitavam incondicionalmente.
Aos 39 anos comendo frango frio no almoço e bendo vinho branco de acompanhamento decidiu se arriscar mais,colocou um bom tênis bermuda e camiseta e foi caminhar.
Reviu velhos vizinhos que mais pareciam novos pois os vira com uma irregularidade tal,sentiu-se um estrangeiro no seu próprio bairro uma pequena Dinamarca em sua cidade.
Caminhou horas a fio e pode ouvir pássaros cantando,corais de igreja entoando Bach,ajudou uma senhora com as compras se sentiu util e na volta pra casa Pico Terceiro o aguardava com um latido de timidez e surpresa.Sorriu e ao sentar no sofá sentiu uma dor forte no peito foi até a janela viu o pôr do sol,despediu-se do dia!

sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009

Conversa

O tempo de quem é?
Indagou deitada na colcha fria fitou o relógio ao lado da cama e deu seu salto matinal,rotina.Pela manhãs um salto pra despertar,um gole de chá e torradas com requeijão.Banho rápido,uniforme,bolsa,celulares e antes de sair deveria fazer uma ligação pra mãe,aniversário batia-lhe a porta.Uma senhora de cinquenta anos acordou em sua casa neste momento e espera o telefonema de uma moça hoje com 23 anos que vez por outra era chamada de filha.
Tudo isso pensou ela sem ter certeza se por algum segundo fosse real pegou o telefone e discou a cada segundo de chamada um aperto maior no peito,a mãe atendeu:Olá mãe vou jantar hoje as 20:00 horas com a senhora.
-Claro te espero querida.
A conversa terminou apenas um silêncio e o soluçar de um choro profundo vindo dos dois lados da linha seguido por um click denotando que alguém desligou, fora a moça da história.
Elas eram antagonicas e fiéis aos sentimentos.
Nunca conversavam sobre namorados,parentes ascendentes,o trivial era-lhes necessário mãe e filha e só,filha e mãe e só,só filha e mãe.
Havia completado 23 anos fazia três semanas e a mãe que estava em Paris nesta ocasião deixou um buquê lindo pra filha reservado há meses na melhor floricultura da cidade,a jovem abraçou o buque tão grata que não sentiu falta da mãe.
As flores cálidas irradiou o médio apartamento da recém dentista.Hora de retribuir o presente,claramente sabia que seria impossível fazer a mãe sentir aquela alegria que houve em seu peito quando abraçou as flores tão bem dispostas naquele buquê.
As 20:00 horas depois de se apresentar ao porteiro do prédio da mãe que mal reconhecera a visitante distinta subiu ao apartamento da mãe e ofereceu-lhe bombons finos logo que a porta foi aberta pela anfitriã.
Jantaram em silêncio a mãe preparou um peixe com ervas finas para jovem dentista que era vegetariana e se ateve há uma pequena porção da iguaria,o trivial fugiu da sala de jantar.Silêncio!
Meia hora depois e um vinho aberto.Uma senhora de olhos azuis se despede de uma jovem japonesa de olhos molhados.Mãe e filha e só,filha e mãe e só,só mãe e filha.